O
prazo para o consumidor reclamar de defeito ou vício oculto de
fabricação, não decorrentes do uso regular do produto, começa a
contar a partir da descoberta do problema, desde que o bem ainda
esteja em sua vida útil, independentemente da garantia. O
entendimento, unânime, é da Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que manteve rejeição de cobrança por reparo de
trator que apresentou defeito três anos depois de vendido. A loja
ainda deverá ressarcir o consumidor pelo tempo em que a máquina
ficou indisponível para uso em razão da manutenção. A empresa
vendedora do trator buscava no STJ receber os quase R$ 7 mil
equivalentes ao conserto do bem. Ela alegava que o defeito surgiu
quando o prazo de garantia do produto, de oito meses ou mil horas de
uso, já havia vencido. Segundo a loja, o problema deveria ser
considerado desgaste natural decorrente do uso do produto por mais de
três anos. Ela pretendia ainda reverter a condenação por lucros
cessantes obtida pelo consumidor em reconvenção. O ministro Luis
Felipe Salomão rejeitou os argumentos da fornecedora. Para o
relator, ficou comprovado nas instâncias inferiores que se tratava
de defeito de fabricação. Em seu voto, ele citou testemunhas que
afirmaram ter ocorrido o mesmo problema em outros tratores idênticos,
depois de certo tempo de uso. As instâncias ordinárias também
apuraram que a vida útil do trator seria de 10 mil horas, o que
equivaleria a cerca de dez ou doze anos de uso. Obsolescência
programada: Para
o relator, o Judiciário deve combater práticas abusivas como a
obsolescência programada de produtos duráveis. Segundo Salomão,
essa prática consiste na redução artificial da durabilidade de
produtos e componentes, de modo a forçar sua recompra prematura, e é
adotada por muitas empresas desde a década de 20 do século passado.
Além de contrariar a Política Nacional das Relações de Consumo,
avaliou o ministro, a prática gera grande impacto ambiental. “Com
efeito, retomando o raciocínio para o caso em apreço, é com os
olhos atentos ao cenário atual – e até com boa dose de malícia,
dada a massificação do consumo – que deve o Judiciário analisar
a questão do vício ou defeito do produto”, afirmou.
“Independentemente de prazo contratual de garantia, a venda de um
bem tido por durável com vida útil inferior àquela que
legitimamente se esperava, além de configurar um defeito de
adequação (artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor – CDC),
evidencia quebra da boa-fé objetiva, que deve nortear as relações
contratuais, sejam elas de consumo, sejam elas regidas pelo direito
comum”, acrescentou o relator. “Constitui, em outras palavras,
descumprimento do dever de informação e a não realização do
próprio objeto do contrato, que era a compra de um bem cujo ciclo
vital se esperava, de forma legítima e razoável, fosse mais longo”,
completou o ministro Salomão. Garantia
e durabilidade: Ele
entendeu que, por se tratar de vício oculto, o prazo decadencial
deveria ser contado a partir do momento em que o defeito fosse
evidenciado, com base no artigo 26 do CDC. Esse artigo estabelece
prazo de 90 dias para bens duráveis e de 30 dias para produto não
durável, para o consumidor apresentar reclamação quando o vício é
aparente. O ministro Salomão afirmou, porém, que o fornecedor não
será eternamente responsável pelos produtos colocados em
circulação, mas também não se pode limitar a responsabilidade ao
prazo contratual de garantia puro e simples, que é estipulado
unilateralmente pelo próprio fornecedor. Segundo o relator, a
obrigação do fornecedor em consertar o produto acaba depois de
esgotada a vida útil do bem. “A doutrina consumerista tem
entendido que o Código de Defesa do Consumidor, no parágrafo 3º do
artigo 26, no que concerne à disciplina do vício oculto, adotou o
critério da vida útil do bem, e não o critério da garantia,
podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício em um espaço
largo de tempo, mesmo depois de expirada a garantia contratual”,
declarou. (http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=107397)

Sem comentários:
Enviar um comentário