Não
é nula a fiança prestada por fiador convivente em união estável
sem a autorização do companheiro – a chamada outorga uxória,
exigida no casamento. O entendimento é da Quarta Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso interposto por uma
empresa do Distrito Federal. “É
por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento
que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de
modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser
dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança”,
afirmou o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão. Outorga
uxória: A
empresa ajuizou execução contra a fiadora devido ao inadimplemento
das parcelas mensais, de dezembro de 2006 a novembro de 2007,
relativas a aluguel de imóvel comercial. Com a execução, o imóvel
residencial da fiadora foi penhorado como garantia do juízo.
Inconformada, a fiadora opôs embargos do devedor contra a empresa,
alegando nulidade da fiança em razão da falta de outorga uxória de
seu companheiro, pois convivia em união estável desde 1975. O
companheiro também entrou com embargos de terceiro. O juízo da 11ª
Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília
rejeitou os embargos da fiadora, mas o Tribunal de Justiça do
Distrito Federal (TJDF) reformou a sentença. “Em
que pese o Superior Tribunal de Justiça entender não ser cabível à
fiadora alegar a nulidade da fiança a que deu causa, ao companheiro
é admitida a oposição de embargos de terceiro quando não prestou
outorga uxória na fiança prestada por seu par”, afirmou o TJDF.
Como foram acolhidos os embargos do companheiro, para declarar nula a
fiança prestada pela fiadora sem a outorga uxória, o TJDF entendeu
que deveria julgar procedentes os embargos apresentados pela própria
fiadora, a fim de excluí-la da execução. Regime
de bens: No
STJ, a empresa sustentou a validade da fiança recebida sem a outorga
uxória, uma vez que seria impossível ao credor saber que a fiadora
vivia em união estável com o seu companheiro. O ministro Salomão,
em seu voto, registrou que o STJ, ao editar e aplicar a Súmula 332 –
a qual diz que a fiança prestada sem autorização de um dos
cônjuges implica a ineficácia total da garantia –, sempre o fez
no âmbito do casamento. Se alguém pretende negociar com pessoas
casadas, é necessário que saiba o regime de bens e, eventualmente,
a projeção da negociação no patrimônio do consorte. A outorga
uxória para a prestação de fiança, por exemplo, é hipótese que
demanda “absoluta certeza, por parte dos interessados, quanto à
disciplina dos bens vigentes, segurança que só se obtém pelo ato
solene do casamento”, segundo o relator. Diferença
justificável: Ao
analisar os institutos do casamento e da união estável à luz da
jurisprudência, Salomão disse que não há superioridade familiar
do primeiro em relação ao segundo, mas isso não significa que
exista uma “completa a inexorável coincidência” entre eles.
“Toda
e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser
analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento – por
um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica
com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico, e, por outro
lado, uma entidade familiar, das várias outras protegidas pela
Constituição”, afirmou o ministro. “O
casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum
aspecto da união estável – também uma entidade familiar –,
porquanto não há famílias timbradas como de segunda classe pela
Constituição de 1988”, comentou. Salomão concluiu que só quando
se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que se
tornam visíveis suas diferenças em relação à união estável, “e
apenas em razão dessas diferenças que o tratamento legal ou
jurisprudencial diferenciado se justifica”. Para o relator, a
questão da anuência do cônjuge a determinados negócios jurídicos
se situa exatamente neste campo em que se justifica o tratamento
diferenciado entre casamento e união estável. Escritura
pública: Luis
Felipe Salomão não considerou nula nem anulável a fiança prestada
por fiador convivente em união estável, sem a outorga uxória,
mesmo que tenha havido a celebração de escritura pública entre os
consortes. Ele explicou que a escritura pública não é o ato
constitutivo da união estável, “mas se presta apenas como prova
relativa de uma união fática, que não se sabe ao certo quando
começa nem quando termina”. Como a escritura da união estável
não altera o estado civil dos conviventes, acrescentou Salomão,
para tomar conhecimento dela o contratante teria de percorrer todos
os cartórios de notas do Brasil, “o que se mostra inviável e
inexigível”. (http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=113472)
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